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Cinquenta tons de briga
Após três meses de fenômeno popular, chega ao fim a trilogia "Cinquenta Tons". Os personagens sadomasoquistas da série que arrebatou o público feminino agora decidem se casar
Marcos Diego Nogueira
Após atingir a fantástica marca de 40 milhões de livros vendidos em todo o mundo, a trilogia erótica “Cinquenta Tons...”, da escritora inglesa E L James, tem o seu último volume lançado também no Brasil esta semana, saciando a curiosidade dos leitores que não conseguem se afastar dos calhamaços de cerca de 500 páginas cada um. Em “Cinquenta Tons de Liberdade” (Intrínseca), o relacionamento amoroso entre a universitária Anastasia Steele e o jovem empresário Christian Grey atinge tonalidades acima do “soft porn” que transformou a autora em fenômeno literário entre as mulheres e trouxe de volta às listas dos best-sellers um gênero de romance que estava esquecido. Logo nas primeiras páginas desse terceiro episódio, o casamento dos dois protagonistas é mostrado com todo o luxo que um executivo endinheirado pode oferecer. A partir daí, no entanto, a malícia e o prazer do sadomasoquismo que marcaram os volumes anteriores da série dividem o lugar com os conflitos cotidianos de um casal às voltas com a pergunta básica dos que se propõem em relacionamento duradouro: teria sido uma paixão fugaz ou está nascendo um amor verdadeiro?
Essa constatação óbvia é defendida pela autora, que iniciou a trilogia em 2009. O primeiro livro mostra o encontro, em uma entrevista, da aspirante a jornalista, de 22 anos, e do bem-sucedido empresário, seis anos mais velho. A paixão, instantânea, é acompanhada de uma proposta indecorosa: o amante sugere à garota um tratado de submissão em que ele teria o controle do prazer. Em linguagem direta: sadomasoquismo. O segundo estágio da paixão flagra Ana (como também é chamada) em dúvida a respeito de seus sentimentos. Ela muda de vida, tenta esquecer o parceiro, mas volta atrás após uma “renovação” no tal acordo. Em “Cinquenta Tons de Liberdade”, o casamento é a prova de fogo para os dois, que se veem obrigados a encarar as inseguranças pessoais e superar as primeiras brigas.
SINTONIA
A escritora E L James apostou no sucesso da literatura erótica
desde que fosse feita com boa dose de romantismo
Enquanto Grey não consegue conter o impulso dominador, Ana tem dificuldade de se encaixar no padrão do seu rico marido. Sofre também com a linha tênue que separa a submissão sexual da conjugal. “Talvez devêssemos combinar uma senha para quando ele estiver agindo de forma autoritária e dominadora, para quando estiver sendo um babaca. Dou uma risadinha. Talvez a senha devesse ser babaca. Uma ideia muito interessante”, diz a si mesma a personagem feminina em determinado momento do livro.
Segundo o psiquiatra Eduardo Ferreira-Santos, autor do livro “Ciúme: o Lado Amargo do Amor” (Summus), esse é o momento que todo casal vence antes de assumir um compromisso duradouro. “Existem diferenças qualitativas entre namorados, casal e família. Na relação conjugal, a convivência deixa de ser um brinquedo, um prazer, para ser uma responsabilidade de manutenção de uma casa e da própria relação”, diz Ferreira-Santos.
A capacidade de moldar essas receitas numa trama palatável e provocante é um dos atributos que tornaram a obra de E L James facilmente identificável para os leitores, especialmente do sexo feminino. “A pornografia para as mulheres não é nova. Mas houve uma permissão social com ‘Cinquenta Tons’. É um livro que apresenta um romance e isso facilita a leitura”, diz a psicóloga especialista em sexualidade Giovanna Lucchesi. Uma estratégia de sucesso da editora foi não deixar o ímpeto dos leitores esfriar. Da chegada do primeiro livro até o último, o intervalo foi de três meses, tempo muito curto para lançamentos desse porte. O próximo passo será produzir o filme em tempo hábil para que seja lançado em 2013 e pegue carona no fôlego que mantém o título entre os mais vendidos. Fôlego esse que Anastasia Steele e Christian Grey perseguem para manter acesa a sua relação.
Fotos: Glowimages; The Toronto Star/ZUMApress.com; Divulgação
O livro chega às lojas na quinta-feira 8. Leia um trecho do primeiro capítulo:
Olho para cima, pelas brechas do guarda-sol verde, para o mais azul dos céus: um azul de verão, um azul mediterrâneo, e solto um suspiro de satisfação. Christian está ao meu lado, estirado sobre uma espreguiçadeira de praia. Meu marido — meu belo e sensual marido, sem camisa e usando uma bermuda feita de calça jeans cortada — está concentrado em um livro que prevê o colapso do sistema bancário ocidental. Pelo que todos comentam, é viciante de se ler. Eu nunca o tinha visto tão quieto assim, nunca. Mais parece um estudante do que o bem-sucedido CEO de uma das maiores empresas privadas dos Estados Unidos.
Estamos no final da nossa lua de mel, aproveitando o sol da tarde na praia do Beach Plaza Monte Carlo — um nome bem apropriado —, em Mônaco, embora na verdade não estejamos nesse hotel. Abro os olhos e fito o Fair Lady, ancorado no porto. Naturalmente, estamos hospedados a bordo de um luxuoso iate. Construído em 1928, o Fair Lady flutua majestosamente sobre as águas, soberano em relação a todos os outros iates do porto. Parece um brinquedo de dar corda. Christian o adora; suspeito até de que ele esteja tentado a comprá-lo. Francamente… homens e seus brinquedos.
Recostando-me confortavelmente, escuto a lista de Christian Grey no meu iPod novo e cochilo sob o sol de fim de tarde, relembrando o pedido de casamento. Ah, um pedido dos sonhos, no ancoradouro… Quase consigo sentir o aroma das flores do campo…
— Podemos nos casar amanhã? — murmura Christian suavemente no meu ouvido.
Estou languidamente recostada no peito dele, na cobertura florida do ancoradouro, satisfeita depois de fazermos amor apaixonadamente.
— Hmm.
— Isso é um sim? — Capto expectativa na voz dele.
— Hmm.
— Um não?
— Hmm.
Sinto seu sorriso.
— Srta. Steele, você está sendo incoerente?
Sorrio também.
— Hmm.
Ele ri e me abraça apertado, beijando o alto da minha cabeça.
— Então está combinado. Vegas amanhã.
Meio dormindo, levanto a cabeça.
— Acho que meus pais não ficariam muito felizes com isso.
Ele passa os dedos pelas minhas costas nuas, para cima e para baixo, acariciando-
me ternamente.
— O que você quer, Anastasia? Vegas? Um casamento grande, com tudo a que
tem direito? Vamos, diga.
— Grande não… Só os amigos e a família.
Ergo o olhar para ele, enternecida pela súplica silenciosa em seus brilhantes olhos cinzentos. O que ele quer?
— Tudo bem — concorda ele. — Onde?
Dou de ombros.
— Pode ser aqui? — pergunta Christian, hesitante.
— Na casa dos seus pais? Eles não vão se importar?
Ele resmunga.
— Minha mãe ficaria no sétimo céu.
— Aqui, então. Tenho certeza de que minha mãe e meu pai vão preferir.
Ele acaricia meu cabelo. Eu não poderia estar mais feliz.
— Bom, já resolvemos onde; agora vamos definir quando.
— Você tem que perguntar para a sua mãe, é claro.
— Hmm. — O sorriso dele desaparece. — Posso dar a ela um mês, no máximo.
Quero muito você, não posso esperar mais que isso.
— Christian, eu já sou sua. Faz um bom tempo. Mas tudo bem: um mês está bom.
Eu beijo seu peito, um beijo suave e casto, e sorrio.
— Você vai se queimar muito — sussurra Christian em meu ouvido, tirando-me do meu cochilo.